O Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) recomendou à Secretaria de Educação (Seeduc) fluminense a suspensão do retorno das aulas na rede pública do Estado, previsto para o dia 13 de abril, por meio do Google Classroom e plataformas similares.
A partir de representação da Comissão de Educação da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), Promotores de Justiça investigam os cursos de aquisição dos sistemas e questionam a qualidade e a viabilidade do modelo de ensino à distância adotado.
"O que a Seeduc está fazendo de forma açodada pode colocar em risco o direito à educação de qualidade de centenas de milhares de adolescentes que não têm acesso À internet, ou tem acesso à internet precário quebrando o ano letivo e fazendo uma distinção de explosão social dramática na rede estadual de educação. Isso é inaceitável", afirmou o presidente da comissão, deputado Flávio Serafini (PSol).
Em nota, a Seeduc alega que "(...) não existe a necessidade de interrupção do processo de ensino a distância. Afinal, os esclarecimentos ao MP já foram feitos e se a secretaria acatar esta recomendação, os alunos poderão ser obrigados a estudar durante as férias de final de ano, até o final de fevereiro, e os profissionais serão obrigados a trabalhar neste mesmo período".
A questão é mais complicada do que parece. Sequer existe no mercado equipamentos e infraestrutura de telecomunicações suficientes para que os quase 50 milhões de alunos da Educação Básica possam continuar os estudos na modalidade EAD.
Além disso, os equipamentos disponíveis são distribuídos de forma muito desigual e ficam concentrados em famílias com maior poder aquisitivo e menos crianças, de modo que é praticamente inviável o EAD nas residências com mais de uma criança no mesmo turno.
Por outro lado, o uso adequado de tecnologias EAD exigem treinamento intensivo tanto de professores, quanto dos alunos, como demonstrou a complicada experiência de redes privadas que adotaram o Google for Education e plataformas análogos nos últimos anos.
Ainda que o Governo se movimentasse para prover a tempo e a modo equipamentos e infraestrutura e capacitação, o que não acontecendo, o EAD não seria um substituto adequado para o presencial na Educação Básica, especialmente para a Educação Infantil e para os primeiros anos do Ensino Fundamental. Tanto é que até o momento o Ministério da Educação é reticente em autorizar essa alteração.
Crianças pequenas ainda não tem habilidades técnicas, psíquicas e intelectuais para lidar de forma satisfatória com o EAD, o que transfere uma carga insuportável para as famílias. Além disso, muitos pais preferem, acertadamente, reduzir a exposição dos pequenos à internet para prevenir overdose tecnológica e problemas em seu desenvolvimento ético e acadêmico.
Muitas escolas particulares, diante do dilema do risco de suspensão das mensalidades durante o confinamento imposto pela pandemia de Covid-19 e dos problemas da adoção precoce do EAD para as crianças, estão optando pela segunda alternativa.
Como a perda da qualidade de ensino e a sobrecarga das famílias são inquestionáveis, é polêmica a manutenção da cobrança das mensalidades, como já discutimos em artigo anterior.
Ratificamos nosso posicionamento que a solução mais adequada para ambas as partes é a negociação. Aqui o ótimo é inimigo do bom, porque a escolha é entre a solução ruim (EAD) e o solução pior ainda (a suspensão pura e simples das atividades escolares).
Seguem aqui dicas para a busca da solução menos ruim para a Educação dos pequenos:
1) As famílias devem manter na medida do possível o pagamento das mensalidades, e as escolas devem prestar os serviços escolares contratados à distância com a melhor qualidade possível e ainda compensar as perdas de rendimento dos alunos com atividades presenciais suplementares após o período de confinamento.
2) As escolas devem conceder, de forma proporcional e na medida do possível, prorrogação de prazo e descontos nas mensalidades às famílias que, comprovadamente, tiverem sua capacidade de pagamento comprometida pela pandemia de Covid-19.
3) É necessário que os estabelecimentos de ensino disponibilizem canais para negociação à distância com as famílias com dificuldade para manter o pagamento das mensalidades, de maneira a evitar deslocamentos que exponham as pessoas envolvidas a risco.
4) Às famílias com mais de um filho no mesmo turno e sem equipamentos suficientes em casa, devem ser oferecida a possibilidade de horário alternativo ou subsidio para aquisição de equipamentos complementares.
5) O Poder Público deve exigir que as grandes corporações provedoras de internet, equipamentos e sistemas de ensino à distância pratiquem preços módicos durante a crise e evitar a todo custo a ocorrência de superfaturamento e sobrepreço, que são muito comuns em contextos emergenciais.
6) A sociedade deve exigir que o Estado ofereça, para aquisição de equipamentos para a EAD de estudantes da Educação Básica no período de confinamento, crédito subsidiado às famílias mais pobres e equipamentos e internet gratuita para as famílias beneficiárias do Bolsa Família ou programas de inclusão semelhantes.
7) Famílias, escolas e Poder Público precisam unir forças para combater a evasão escolar crescente nesse período de isolamento social, que pode causar gravíssimos prejuízos às pessoas e à sociedade e ao próprio Estado.
Edvaldo Fernandes da Silva
Pós-Doutorando em Ciência Política, Doutor em Sociologia, Mestre em Ciência Política, jornalista, advogado, professor de Educação Básica (1991-1996), professor universitário e cofundador da Rede Pedagógica.
Comments